quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Como entender Ml 3:7-10

O texto que está em Ml 3:7-10 é uma das preferidas, dos que apoiam a prática obrigatória do dízimo hoje. A razão pela qual vamos nos deter sobre ela, é para procurar entendê-la corretamente.Vejamos o que ela diz realmente:

“Pode um homem roubar de Deus? Contudo vocês estão me roubando. E ainda perguntam: ‘Como é que te roubamos?” Nos dízimos e nas ofertas. Vocês estão debaixo de grande maldição porque estão me roubando; a nação toda está me roubando. Tragam o dízimo todo ao depósito do templo, para que haja alimento em minha casa. Ponham-me à prova, diz o SENHOR dos Exércitos, e vejam se não vou abrir as comportas dos céus e derramar sobre vocês tantas bênçãos que nem terão onde guardá-las.”

Antes de entrar nos detalhes, não esqueçamos de que dízimo, na Bíblia, nunca foi dinheiro!  (Dt  14:22-29). É claro que alguns querem justificar dizendo que esse texto não tem a intenção de discutir se o dízimo deve ser dado ou não em dinheiro. Mas, qualquer leitor percebe facilmente que Deus insiste que o dízimo era o produto produzido pela terra.

Já sabemos que não se pode interpretar corretamente certas passagens, sem considerar o contexto em geral, afim de entendermos qual foi a intenção do escritor, isto é, o que ele queria que os seus leitores entendessem. Se uma pessoa dá um sentido a determinada passagem, que não tenha sido o verdadeiro propósito do escritor, errou na interpretação da passagem, porque tomou o lugar do autor, dando a determinada passagem o significado que quer, mas não o verdadeiro significado. O contexto histórico, como já sabemos, é de suma importância, e deve ser levado em consideração também no texto acima citado. Acerca disso o Dr. James Braga, autor do livro Como Interpretar a Bíblia, faz o seguinte comentário:

“Concluímos, portanto, que, para obtermos o devido entendimento de um livro ou texto, é necessário que examinemos o seu contexto histórico. Como resultado da negligência a esse aspecto do estudo bíblico tem surgido conceitos errôneos e interpretações falsas.”

Perfeitamente correto! Qualquer hermeneuta honesto sabe disso e, diga-se de passagem, bom seria que antes de muitos tornarem se "grandes pregadores", "bons pastores", "bons evangelistas" se preocupassem em ser  "bons hermeneutas da Bíblia", e, claro, compromissados com a verdade porque existem bons hermeneutas por ai mas, descompromissados com a verdade, que continuam a insistir no erro e induzindo outros a seguirem pelo mesmo caminho. Ai ficam com aquela conversa que é cheio de Deus, cheio da unção, dizem que oram muito e alguns até criticam que estuda teologia, dizendo que não precisa disso etc. Mas que oração é essa que não resulta em compromisso com a verdade bíblica? Que unção do Espírito é essa em que a pessoa não é conduzida a integridade e devido compreensão da Bíblia? Que eu saiba o Espírito não induz ninguém a erro, e muito menos usa pessoas para levar outras ao erro. A verdade é essência de Deus e a verdade é a sua Palavra, foi isso o que Jesus disse em sua oração pelos cristãos de todos os tempos! Ou é unção ou é um cão. Cuidado!

Seguindo a importante dica do Dr. James Braga  vamos observar um fator importante para entendermos o texto, a cronologia dos fatos. A classificação dos livros do Antigo Testamento em nossas Bíblias foi feita por assunto, seguindo o padrão da Septuaginta. Porém, é importante para o leitor saber que o livro de Malaquias, cronologicamente falando, deve vir após o livro de Neemias. Na Bíblia Hebraica, o último livro do AT é Crônicas, não Malaquias, por isso, para o leitor se situar no contexto histórico ele deve saber que o livro de Neemias foi escrito em cerca de 434
a.C., e Malaquias em 432 a.C., ou seja, praticamente no mesmo período.

O contexto histórico
 Qual era a situação histórica ? Claro que é preciso ter um pouco de paciência e dedicação para checar os textos mas isso deve ser feito, se você quer mesmo entender. Quem tem preguiça não estuda e paga um preço por isso, torna-se facilmente manipulável e ainda acha ruim quando contestado.

Pouco se sabe com exatidão sobre a pessoa do escritor e profeta Malaquias, além das informações contidas em seu livro. Quanto à data em que foi escrito, parece ter sido em algum tempo após o século IV a.C., já que as condições religiosas são semelhantes àquelas enfrentadas por Neemias
quando retornou da Pérsia em 431 a.C., afim de assumir suas obrigações como governador de Jerusalém.

O conteúdo do livro de Malaquias indica o seguinte: O templo já havia sido reconstruído (516-515 a.C), os sacrifícios e as festas achavam-se plenamente restaurados, também os cultos com suas cerimônias (Ne 13:1-9). 

Em síntese vejamos quais eram os principais acontecimentos:
1) um conhecimento geral da lei havia sido reintroduzido por
2) uma apostasia subsequente ocorrera entre os sacerdotes e o povo, ( 433 a.C. );
3) além disso, o ambiente espiritual em que Malaquias clamava é semelhante à situação que Neemias encontrara em Judá depois de ter voltado da Pérsia (433-425 a.C.), para servir como governador em Jerusalém pela segunda vez (cf. Ne 13:4 - 30);
4) os dízimos e as ofertas eram negligenciados (Ml . 3:7-12; Ne 13:10-13);
5) e o conserto do casamento era violado, pois os homens judeus divorciavam-se para se casar com mulheres pagãs, provavelmente mais jovens e bonitas (Ml 2:10-16; Ne 13:23-28).

Note, portanto, que naquele ambiente histórico, o dízimo foi apenas uma das outras questões tratadas pelo profeta Malaquias.


Contexto literário

O contexto literário refere-se à análise do texto em si, considerando o que há antes e depois do texto em estudo, analisando-o como um todo. A sonegação do dízimo, foi apenas um dos problemas tratados em Malaquias. Depois do profeta falar sobre os pecados dos sacerdotes (1:6-2:9), dos pecados contra os irmãos (2:10), dos pecados contra Deus na família (2:11-16), do pecado da profissão religiosa hipócrita (2:17) e de profetizar a vinda de João Batista ( Elias-3:1-6), então ele passa a falar sobre o problema do povo ter roubado Deus (3:7-15), e fala ainda sobre o remanescente fiel, do livro de lembranças do Senhor (3:16-18), e sobre o futuro dia do Senhor e a volta de Cristo (4:1-6).
Portanto, à luz do contexto histórico e do contexto do próprio livro (literário), fica fácil perceber que o propósito de Malaquias é exortar os sacerdotes (Ml 2:1, não a igreja, que nem existia ainda), a voltarem-se para Deus, a quem abandonaram, a fim de não serem destruídos no dia juízo.

Extrair os versículos (7-10), afim de argumentar, ensinar e exigir que os cristãos são obrigados a dizimar, está contra os princípios da hermenêutica, pois não está sendo levado em conta o contexto.

Como diz a famosa frase “texto sem contexto é pretexto para heresias". E tem muita gente com heresia por ai se baseando no texto de Malaquias para cobrar dízimos! É errado interpretar um texto fora do seu contexto pois vai proporcionar um ensino errado, esteja isso sendo feito de forma consciente ou inconsciente. Sendo assim, se alguém ousa exigir o pago do dízimo com base em Ml 3:7-10, é forçosamente obrigado a cumprir todas as outras exigências do livro de Malaquias, o que é impossível porque em nossos dias, por exemplo, não existem sacerdotes na igreja (não no mesmo sentido da época de Malaquias), para oferecerem por nós sacrifícios ao Senhor.

Observe, por exemplo, o que diz Malaquias sobre a lei: “lembrai-vos da lei de Moisés, meu servo a qual lhe prescrevi em Horebe para todo o Israel, a saber estatutos e juízos" (4:4). Se os cristãos forem obrigados a pagar o dízimo, eles forçosamente serão obrigados a guardar a lei, pois o mesmo escritor que falou sobre o dízimo, falou sobre a lei (leia Rm 7:4; 10: 4). Porém, se o cristão não precisa observá-la, por que razão ele é obrigado a dizimar?

É hermeneuticamente incorreto, portanto, interpretar um texto fora do contexto, e transformá-lo em artigo de fé. Se alguém conhece os princípios da hermenêutica mas não faz uso deles ao interpretar qualquer passagem da Bíblia, principalmente de forma intencional, está pecando. "Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisso esta pecando" (Tg 4:17 ARA). O conhecimento gera responsabilidade, que se negligenciado, mostra do que somos feitos por dentro.

Afinal o cristão estará roubando a Deus se não der o dízimo do seu salário?

Claro que não! Além de não sermos obrigados a observar mais a lei (Lc 16:16), esse texto não foi escrito para a igreja pois os cristãos nem mesmo existiam naquela época!

Já sabemos que a mensagem de Malaquias foi para os judeus que viveram na época de Neemias e Esdras, não foi para nós cristãos.

O texto de Ml 3:8, não serve de base para isso em nossos dias, como já sabemos. Vamos ver mais uma vez o texto: “Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais, vós, a nação toda” (ARA).

Observe antes de tudo, que Deus está identificando claramente o destinatário da mensagem, a saber a nação. A palavra nação aqui não foi usada no sentido espiritual, pois hoje nós (a igreja constituída em Cristo) somos o “Israel de Deus”, no sentido espiritual do termo (Gl 6:16). Quando Deus falou por meio do profeta Malaquias a igreja ainda não existia, portanto, não era seu objetivo dirigir-se ao "Israel o espiritual”, a igreja cristã, pois a base da relação entre os cristãos e Deus é a fé em Cristo e não a lei do AT, na qual, entre outras coisas se encontra a doutrina do dízimo. Ele está falando com a nação segundo a carne, mas você, eu presumo, não é judeu por nacionalidade e nem por religiosidade mas, ainda que seja, se for convertido a Cristo está livre da lei, na qual se baseia o dízimo. À luz do contexto fica ainda mais fácil entender isso. No versículo 6, Deus identifica a nação como “filhos de Jacó”, pois toda a nação judaica é descendente de Jacó (Gn 29:32; 30:1-24; 49:1-33). A expressão "filhos de Jacó", refere-se ao Israel segundo a carne.


PARA OS QUE INSISTEM EM SE BASEAR NO TEXTO MALAQUIAS 3:7-10 PARA DIZIMAR


Vamos ler novamente o texto:

Roubará o homem a Deus? Todavia vós me roubais, e dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas. Com maldição sois amaldiçoados, porque a mim me roubais, sim, toda esta nação. Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa, e depois fazei prova de mim nisto, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não derramar sobre vós uma bênção tal até que não haja lugar suficiente para a recolherdes. E por causa de vós repreenderei o devorador, e ele não destruirá os frutos da vossa terra; e a vossa vide no campo não será estéril, diz o Senhor dos Exércitos. (Malaquias 3:8-11)

Se fôssemos a outras partes da Bíblia contestaríamos sem dificuldade tal ensino, mas o próprio contexto literário joga por terra essa doutrina errada. Malaquias, como já vimos, escreveu sobre muitos outros assuntos, mas quase nunca ouvimos alguém falar de outros assuntos quando de menciona Malaquias, só dos dízimos. Por quê? Precisamos ser honesto e ler o livro todo tendo em mente que SE FORMOS UTILIZAR O ENSINO DO PROFETA MALAQUIAS para basear uma doutrina, (no caso a doutrina do dízimo) seremos obrigados a levar em conta o livro todo e todos os ensinos e orientações contidas nele, não apenas um texto que gostamos ou preferimos!

É aqui neste ponto que eu quero lembrar o que Malauias diz um pouco mais a frente (Mal 4:4):

Lembrai-vos da lei de Moisés, meu servo, que lhe mandei em Horebe para todo o Israel, a saber, estatutos e juízos.” 


Bem, se eu quero seguir as ordens do livro de Malaquias, não posso selecionar o que eu acho bom e ignorar o que eu acho ruim, tenho que considerar tudo o que ele ensina. Nesse versículo o mesmo Malaquias que ensinou sobre o dízimo, está agora falando da necessidade da observação da Lei do AT, dada através de Moisés. Logo, se eu uso o livro de Malaquias para cobrar dízimos tenho que usá-lo também para lembrar e lembrar aos outros que precisamos observar a lei do AT! É isso o que o contexto nos manda fazer! Malaquias está dizendo para fazer isso! Mas isso eu não vejo os cobradores de dízimo que se baseiam em Malaquias dizer, nem ensinar! Por que? O contexto é completamente ignorado ao bel prazer. 

Se alguém crer, ensina e prega com base em Malaquias que as pessoas precisam ser dizimistas, essa mesma pessoa precisa crer, ensinar e pregar que os crentes devem observar a lei do AT. Mas não vejo sacrifícios de animais, apedrejamento de pessoas, não vejo filhos recebendo severo castigo e nem sendo mortos por desobediência aos pais! Mas a lei do AT manda fazer isso e Malaquias exorta os seus leitores a fazer isso! Não vale escolher o texto que eu quero, isso é desonesto! Portanto, se você se baseia no livro do profeta Malaquias para ser dizimista e/ou para ensinar a doutrina do dízimo, lembre-se também de observar a lei de Moisés, pois essa é a orientação de Malaquias, o profeta.

Espero que o que foi dito até aqui tenha servido para elucidar essa questão e esclarecer que não é certo se basear em Malaquias para exigir o dízimo.

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